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Culture

“Quero servir de inspiração para mais mulheres”: Helena Deyama fala sobre carreira e troféus que ainda quer conquistar 

This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

O rally é uma das categorias mais desafiadoras do automobilismo. Enfrentando o possível e o impossível para alcançar seus objetivos, competidores encaram lama, sol, frio, vento e qualquer outro obstáculo que a natureza imponha. Apesar de tudo isso, é justamente atrás do volante e levantando poeira que Helena Deyama se sente no “seu elemento”. A “Japonesa Voadora”, como é conhecida por causa das manobras que faz com os carros, concluiu em 2024 sua 20a participação no Rally dos Sertões, o maior rally das Américas, registrando mais um pódio em uma carreira de mais de 25 anos repleta de conquistas.

“A sementinha da aventura” 

Descendente de japoneses, Deyama vem de uma família tradicional. Filha de um professor da USP e de uma dona de casa, ela nasceu em São Paulo e sempre soube que teria que trabalhar para conquistar seus sonhos. Foi em Registro, cidade natal da mãe, que teve o primeiro contato com as emoções sobre duas e quatro rodas, ainda na adolescência. Lá, pôde alimentar sua “sementinha da aventura”, que, segundo ela, não foi herdada da família, mas sempre esteve lá.  

 “Eu só queria aventura. Ia para a fazenda onde minha mãe nasceu, pegava a bicicleta e ficava me aventurando pela terra”. Aos 15 anos, aprendeu a dirigir trator e moto com amigos, antes mesmo de aprender a dirigir carros. “Eles me ensinaram a pilotar uma moto. Uma cinquentinha, motinha de 50 cilindradas e eu fiquei doida. Eu amei e não queria andar na garupa, queria ‘eu pilotar’”. Daí surgiu o primeiro grande sonho: ter a própria moto. 

Aos 17 anos, terminou o Ensino Médio e o curso técnico de desenho e foi trabalhar em uma agência de publicidade, onde logo foi efetivada. “Falei para o meu pai ‘eu vou continuar trabalhando até eu ter dinheiro para comprar minha moto. Depois que eu comprar minha moto eu entro na faculdade’”. Dois anos depois comprou uma Yamaha DT125 Trail, moto que utilizava para ir a faculdade, passear na terra e que foi apelidada de Janis Joplin.

As experiências sob quatro rodas 

Na faculdade, cursou belas artes, seguindo a paixão pelo mundo artístico. “Eu era toda molecona, gostava de bicicleta, moto e trator. Mas eu sempre gostei de artes”. Além das artes plásticas, Deyama também estudou música e já tocou piano, violão e bateria numa banda de rock, e violoncelo numa orquestra de cordas.  

Continuou trabalhando e abriu uma microempresa de design gráfico aos 25 anos, que manteve por três décadas. Especializou-se em catálogos para empresas e começou a juntar recursos para ir mais longe. Pensou em comprar uma moto maior, mas com apenas 1,54m e 49kg, Heleninha, como é conhecida no rally, desistiu da ideia, pois é muito pequena e não alcançaria o pé no chão. Em 1995, 16 anos após a primeira moto, comprou um jipe Engesa, marca que produzia veículos militares e rodou os primeiros quilômetros como piloto de rally. 

Deyama aprendeu a fazer trilhas na Serra da Cantareira, interior de SP, e fez parte de alguns “Jeep Clubes”. Foi com o Jeep Clube do Brasil, grupo de São Paulo, que participou de sua primeira prova, o Raid da Primavera, um rally de regularidade em que participantes não precisam ser os mais rápidos, mas sim os mais precisos e quem faz menos pontos, vence. Desde o primeiro contato com o off-road, Heleninha impressionou: ficou em primeiro lugar, com a pontuação de -1.

“Eu entrei de cabeça nesse negócio de jipe e daí veio o sonho de correr o Rally dos Sertões”. Porém, praticar esporte a motor é caro (atualmente, Deyama tem um custo de aproximadamente R$300.000,00 para correr o Sertões) e sozinha, ela não conseguiria bancar. Em 1999, conseguiu o apoio da Troller, marca de veículos 4×4 e o patrocínio da Pirelli, fabricante de pneus, para correr seu primeiro Sertões, aos 39 anos de idade. Junto da navegadora Katia Stefani, tornaram-se a primeira dupla feminina a participar da competição e conseguiram terminar a prova. Em 2000, chegaram em segundo lugar. 24 anos depois, Helena continua fazendo parte da única dupla feminina da competição, ao lado de Cristina Starling, com quem corre desde 2021.

O acidente, o príncipe e a resiliência para continuar 

Em mais de duas décadas de experiência no automobilismo, Deyama só pensou em desistir do off-road uma vez. Em 2009, viu seu carro pegar fogo e virar cinzas devido a um incêndio que se acredita ter sido causado por um vazamento de combustível. Ela e a navegadora Josi Koerich escaparam com vida por uma questão de segundos.  

No momento do ocorrido, pela primeira vez, pensou em desistir. “Eu chorava de soluçar. Falava pra Josi ‘Acho que é um sinal de Deus, que é fim de linha pra mim’”. O carro tinha sido financiado, não estava pago e ela não conseguiria comprar um novo. Outros competidores se mobilizaram para ajudá-la, mas o principal auxílio veio de forma inesperada: Nasser Al-Attiya, príncipe catari que é piloto de rally e viera correr o Sertões pela primeira (e única) vez, doou US$20.000,00. “Isso agora é um sinal que não é pra eu desistir. É mais uma luta da minha vida. Vou conseguir o resto do dinheiro e vou comprar um carro novo”, acreditou Heleninha.

Em homenagem a Al-Attiya, Deyama colocou o nome de “Príncipe” na L200 (caminhonete que ela costumava usar para competir) que comprou após o acidente.  

Desde então, foi a primeira mulher bicampeã do Brasileiro de rally BAJA com UTV* (2014 e 2016) e em 20 participações no Sertões, foi ao pódio 14 vezes. O que falta? “Eu quero subir no pódio do Rally dos Sertões no primeiro lugar. Já fui segundo, terceiro, quarto, quinto… Da minha categoria, eu já ganhei um campeonato brasileiro e o Sertões faz parte do campeonato brasileiro, mas eu não ganhei o Rally dos Sertões.” 

O sonho de mais mulheres no automobilismo

Helena revela que, no início de carreira, alguns colegas homens duvidaram de sua capacidade, mas a vitória logo no primeiro raid ajudou a conseguir mais credibilidade: “Achavam que eu ia ter muita dificuldade, aí já cheguei detonando tudo, conquistei meu respeito”. Pioneira na área, um dos seus maiores sonhos atualmente é aumentar cada vez mais a presença feminina no rally e no automobilismo. Com isso em mente, em 2020, criou o MUSA (Mulheres Unidas Sertões Adentro), junto com a piloto de moto Moara Sacilotti, primeira mulher a vencer um Sertões e com a jornalista Karina Simões, especialista em esporte a motor.

 “A gente queria montar uma equipe 100% feminina, que tivesse uma moto, um UTV e um carro. E uma equipe mesmo, com mecânicas mulheres, chefe de equipe, a motorista do caminhão, da van, nutricionista”. Por falta de capital e apoio empresarial, o projeto ainda não se concretizou, mas elas continuam trabalhando para isso. O MUSA tornou-se um movimento que une e divulga as participantes mulheres do Rally, pilotos e navegadoras, e busca incentivar cada vez mais a participação feminina. “Eu fico feliz que eu consegui pelo menos unir as mulheres de alguma forma, já que montar da forma que eu idealizei é realmente um sonho bem grande”.

Quando venceu o Campeonato Brasileiro de Rally Cross Country em 2005, tornou-se a primeira mulher a realizar este feito, aos 45 anos, e dedicou a vitória a todas as mulheres. “O meu objetivo com tudo que eu faço, com meu esporte, eu falo que não é pra mim, eu quero incentivar. As minhas conquistas, que não foram nada fáceis, eu quero que sirvam de exemplo pra mais mulheres se sentirem poderosas, fortes e acreditarem na sua capacidade. Quero realmente servir de inspiração para mais mulheres”.

*UTV ou Utility Task Vehicle é um veículo que mistura características de quadriciclo e carro. O da Heleninha foi apelidado de “Monstrinho”.

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O artigo acima foi editado por Beatriz Martins.

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Olivia Nogueira

Casper Libero '26

Brazilian journalism student who loves to talk about music, books, TV shows and Formula One.