Imagine uma super-mãe: ela acorda às quatro horas da manhã para treinar, depois prepara o café da manhã e lanche das crianças, depois se arruma e fica perfeita para acordar os filhos – tudo isso antes das 7h da manhã. Depois de deixar os filhos na escola ela vai trabalhar e quando volta ainda tem disposição para brincar, ler, arrumar a casa e ficar bonita para quando o marido chegar. Além disso, ela aplica educação positiva e faz vídeos para internet sobre maternidade. Você conhece uma mãe perfeita assim? Eu só as conheço na internet.
A verdade é que uma maternidade perfeita como essa não existe, mas muitas mulheres acabam romantizando a sua rotina exaustiva nas redes sociais, com um sorriso no rosto e passando uma imagem falsa daquilo que realmente acontece. Esse comportamento pode acabar gerando insegurança nas mães que consumem esse tipo de conteúdo. Segundo a coordenadora da psicologia da Unimed Goiânia, Anita Mota Chediak:
“Sob expectativas, intrínsecas e extrínsecas, de modelos idealizados de cuidados com o lar, filho e profissão, a nova mãe também gera e nutre um sentimento de culpa, por não se perceber ou se comportar como os padrões socialmente propagados. Infelizmente, a promoção de um mito de perfeição materna pode contribuir em impactos psicológicos significativos às mulheres, como transtorno dismórfico corporal, transtornos de ansiedade e depressão pós-parto.”
Anita Mota Chediak, em entrevista para a Her Campus Cásper Líbero.
Cada mãe tem uma realidade diferente, sendo assim se torna um problema postar alguns conteúdos com o título “é assim que se faz”, “Ao mesmo tempo em que a ‘maternidade real’, propagada pelas grandes influenciadoras seja algo muito distante para a maioria das mães, possivelmente causando estranheza, mal-estar e fomentação à baixa autoestima, por exemplo, por não conseguirem entrar em forma rapidamente pós-parto, não tendo acesso a rede de intervenções e cuidados que as influenciadoras e seus filhos possuem; por outro lado, parte destas mães sentem certo conforto, por conseguirem vislumbrar mundos diferentes, talvez inacessíveis às mesmas”, completa a psicóloga.
Ao perguntar a Mariele Felix, mãe da Cecília, de três meses de vida, e que compartilha sua rotina nas redes sociais, se ela já se sentiu impotente diante de uma situação mostrada nas redes sociais como algo simples, ela me respondeu: “Sim, na amamentação. No início tinha muita dificuldade, tive os seios machucados, sangrando, chorava como criança por não saber o que fazer e por me sentir impotente de alimentar a minha filha, isso não é mostrado nas redes sociais.”
Além disso, a busca por essa perfeição também pode impactar o vínculo entre mãe e filho. Ao focar excessivamente em alcançar os padrões ditados pelas redes sociais ou por outras fontes externas, a mãe pode acabar negligenciando a sua própria saúde mental e o cuidado emocional com seu filho. Isso pode resultar em um ciclo vicioso de frustração, culpa e estresse.
Stephanie Beatriz, mãe da Chiara, de 11 meses, relata que no começo se comparava com outras mães e se cobrava muito em relação a isso, mas aprendeu com o passar dos meses que a conexão com sua filha era mais importante do que seguir uma “fórmula” que não existe.
O outro lado da história
Para entender melhor sobre a questão do postar sobre a maternidade foram feitas algumas perguntas para Mariele e Stephanie:
Como é para você divulgar sua rotina nas redes sociais?
Mariele: “Ainda me sinto um pouco insegura, mas ao mesmo tempo que fico “o que vão pensar de mim?” penso: é bom compartilhar minha rotina para que: quem ainda não é mãe ter uma base de como é, e de quem é mãe de primeira viagem não se sentir sozinha.”
Stephanie: “Muito essencial para mostrar a realidade de uma maternidade.”
Você acha importante divulgar sua rotina?
Mariele: “Eu acho uma ideia legal, para verem que a vida de mãe não se resume apenas a amamentar e trocar fraldas.”
Stephanie: “Sim, com certeza.”
Existe uma fórmula para a maternidade? Por que você acha que as pessoas compartilham como se tivesse?
Mariele: “Eu acredito que não. Maternidade é Instinto, diferente e individual. Acredito que na mente delas, o que deu certo em algum momento, é ‘obrigatório’ a dar certo pra outra pessoa. Ao invés de compartilhar experiências como ‘dicas’, compartilham no sentido de ‘você tem que fazer assim e VAI dar certo’.”
Stephanie: “Não, o que precisamos é criar uma conexão com nossos filhos. Acredito que seja pra poder mostrar que tem uma maternidade perfeita, mas não existe, todas nós passamos por medos e culpas.”
Segundo a psicóloga Anita, a educação de filhos percorre muitos desafios, especialmente por não ser cristalizada, já que cada pessoa é única, sendo agente modificador do meio e sendo modificada por ele. No mundo vigente, BANI (sigla criada em 2018 pelo antropólogo norte-americano Jamais Cascio, que, em português, significa Frágil, Ansioso, Não linear e Incompreensível) diz que quanto mais “pronta” a fórmula, mais rapidamente será consumida. Por isso, muitas mães produzem e consomem esses conteúdos que na maioria das vezes não fazem bem para nenhum dos lados.
Lembrando também que não é nenhum pecado postar sobre maternidade pois as dicas e experiências são valiosas para identificação de outras mulheres, mas é necessário postar com consciência e sem querer mostrar uma realidade irreal.
O mito da mãe perfeita, alimentado por conteúdos idealizados sobre a educação infantil, exerce uma grande pressão sobre as mulheres e pode afetar profundamente sua saúde mental. A chave para uma maternidade saudável é a aceitação das imperfeições, o cuidado com a saúde emocional e o fortalecimento da rede de apoio.
Afinal, ser uma mãe feliz e equilibrada é muito mais importante do que tentar seguir um modelo de perfeição imposto pela sociedade. A maternidade é um processo de aprendizado contínuo, onde o importante é estar presente, com amor e dedicação. E, quem sabe, liberar-se das expectativas irreais para abraçar a beleza da imperfeição.
“Não existe uma fórmula para maternar! Cada mãe é única, em sua maneira de ser, compreender-se e ao filho, em um processo contínuo de amor, aceitação e ressignificação.”
Anita Mota Chediak, em entrevista para a Her Campus Cásper Líbero.
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O artigo acima foi editado por Ana Luiza Sanfilippo.
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