Sou coreana do sul. Cheguei ao Brasil em dezembro de 2004, quando tinha apenas sete anos, por motivos familiares. Na primeira vez que os meus pais me disseram que iríamos mudar para as terras canarinhas eu tinha um pensamento muito ingênuo de que seria um lugar onde os índios moravam, em harmonia com outros animais. Um lugar coberto por árvores, macacos para lá e para cá(…).
Uma das cenas engraçadas que eu lembro desse tempo é quando o meu pai tentava me explicar que havia uma diferença entre o Brasil e a Amazônia, mas eu não entendia nada. Para mim, para uma criança coreana de sete anos, a terra brasileira era somente uma grande Floresta Amazônica.
Aria Park e o irmão, ainda na Coréia do Sul
Surpreendi-me logo quando saí do aeroporto, porque o Brasil era totalmente diferente do que eu imaginava. Sonhava que iria receber boas-vindas de vários índios pintados, mas veio um amigo do meu pai, árabe, que sabia falar coreano – um espetáculo para mim na época – para nos levar até a nova casa. E fui descobrindo que aqui também tinham carros, prédios e concreto. Uma cidade como qualquer outra.
Obviamente, foi muito difícil para mim, adaptar-me aqui. Foi muito difícil para aceitar uma nova realidade que eu enfrentaria desde então. Precisei aprender a viver de novo. Tudo que vivenciei na Coreia do Sul – a cultura, a língua, o comportamento, os costumes, a convivência e a identidade – foi obrigado a ter uma nova cara. Era necessário ajustar tudo.
Aria Park
Uma das coisas que eu mais sofri nesse processo de adaptação foi aprender o português. Não sabia falar e muito menos escrever. Eu não tinha a mínima noção da língua portuguesa e, consequentemente, nos primeiros anos de vida escolar, não conseguia acompanhar os meus colegas.
A impossibilidade de nem conseguir escrever meu nome me decepcionou profundamente: no meu primeiro dia de aula, meu dever era escrever “In Young Park” mais de 100 vezes com letra cursiva.
Sempre fui uma menina muito aberta e corajosa desde a infância. Alegre e super participativa nas aulas. Adorava falar, conversar e ler. Porém, quando me tornei “a estrangeira”, tudo isso mudou. Comecei a me fechar com as pessoas e fui obrigada a ser tímida e boba (por não saber me expressar em outra língua).
E, ainda mais, como não sabia me comunicar. Tive muitas barreiras em fazer amizades. Alguns colegas enfiavam caneta na minha bochecha ou davam risadas porque eu não sabia manifestar a raiva em português.
De menina estudiosa para menina que tira zero em todas das provas – exceto inglês e matemática, matérias que não tinham necessidade de serem entendidas em português. De menina extrovertida para menina muda. De menina alegre para menina triste que sempre preferia andar sozinha.
Aria, um pouco antes de chegar ao Brasil
Toda essa evolução me possibilitou a ser uma “brasileira”. E, hoje, depois de ter passado tudo isso, estou aqui escrevendo para você, contando a minha experiência. Claro que ainda persistem vários erros gramaticais. Mas eu consigo me comunicar com você por meio da escrita.
Por isso, apesar de erros e falhas, me orgulho desse texto. Porque me representa uma batalha e grande aprendizagem de quase dez anos e acredito que este papel que você está segurando, ou essa tela em que está olhando, é um certificado de que eu venci todos os obstáculos que me cercava e que nada é impossível.
Texto: Aria Park
Edição: Marcela Schiavon