Com a chegada da família real portuguesa ao Brasil, em 1808, foi criada a Guarda Real de Lisboa, considerada a força militar da época. Porém, com o tempo, e a instalação do rei D. João VI no Rio de Janeiro, foi gerada a Divisão Militar da Guarda Real de Polícia, que se expandiu pelo território com o título de forças armadas oficiais.
Após a elaboração da Constituição Federal e o fim do Estado Novo, em 1946, a divisão militar adotou o termo “Polícia Militar” para as forças armadas. Entretanto, o Rio Grande do Sul manteve a nomeação “Brigada Militar” em suas entidades federativas.
Até 1964, a polícia militar desempenhava funções específicas, como gestão de manifestações e greves. Entretanto, durante a ditadura, a polícia civil foi desmantelada, levando a uma reestruturação significativa. Com supervisão do Exército brasileiro, a instituição passou a operar sob a única missão de reprimir os opositores do regime.
Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, destacou em uma entrevista à Jovem Pan, em 2020, que os policiais militares foram originalmente concebidos com a finalidade de serem semelhantes aos pequenos exércitos em cada estado brasileiro. “É uma força policial que foi criada quase como um mini exército para proteção de uma determinada elite política no início do século passado. Depois a gente passa por um período autoritário, que foi a ditadura militar, em que essa ideia de braço armado do Estado e de combate ao inimigo, foi reforçada. Como qualquer organização, tem uma história e isso muda a forma como elas vão agir no dia a dia”, avalia.
Com o processo de redemocratização, a subordinação da PM foi distribuída para o governo estadual. No entanto, podemos afirmar que muitas das características que definem a Polícia Militar nos dias de hoje ainda têm raízes no período ditatorial.
Na constituição federal, pelo art. 144, refere-se que agressão policial é: toda e qualquer forma de uso ilegal da coerção ou força no exercício da função estatal de segurança pública, portanto, é a partir deste ponto que a justiça age para equilibrar os delitos.
o que os números revelam
No ano de 2022, houve um levantamento que indicava a ocorrência de, em média, 6.430 óbitos causados por policiais civis e militares, enquanto 173 membros das corporações foram mortos em serviço. Esses números revelam um aumento de 30% nas mortes de policiais em comparação com o ano anterior, ao passo que as mortes resultantes de ações policiais tiveram uma redução de 1,9%.
O perfil das vítimas nos confrontos apresentou poucas variações: 99,2% dos falecidos eram do sexo masculino, 75% tinham idades descobertas entre 12 e 29 anos, e 83,1% eram negros.
Quando analisamos as mortes ocorridas em ações policiais, observamos que a proporção de indivíduos pretos falecidos foi ainda mais elevada em relação às mortes violentas de maneira geral, no qual os jovens dessa raça representaram 76,4% das vítimas.
Em 2005, os negros representavam 58,4% da população carcerária total, mas, em 2022, esse percentual atingiu 68,2%, marcando o ápice histórico. Dentro dessas estatísticas, podemos ver que a proporção de pessoas brancas entre os encarcerados diminuiu de 39,8% para 30,4%, ao passo que, entre a população negra, essa proporção cresceu expressivamente, registrando um aumento de 381,3% durante o mesmo período.
o consumo de informação
A mídia é uma grande geradora de opinião e de hábitos, e é a partir do formato que consumimos informação que se criam “imagens” em nossa cabeça, constituindo a memória e determinando a concepção do fato.
A segurança pública, como qualquer outro órgão governamental, necessita de uma boa reputação para gerar na população confiança durante a prática de seu trabalho. Os cidadãos precisam se sentir seguros, mas, infelizmente, isso nem sempre acontece, já que há falhas de comunicação e expressão, tanto dos agentes da força, como dos abordados.
No cinema, o filme brasileiro “Tropa de Elite”, estreado em 2007 e dirigido por José Padilha, é uma trama ficcional produzida com o intuito de retratar a realidade do BOPE (Batalhão de Operações Especiais), em ação contra o tráfico do Rio de Janeiro. Entretanto, durante as cenas em que a unidade precisa subir o morro em suas missões, percebe-se claramente a reação de espanto dos moradores da favela, tornando claro que não é comum um policial subir de forma pacífica, o que fortalece a imagem de que a polícia é agressiva quando está em ação.
Mas o uso da força não fica só na ficção. No Rio de Janeiro, o tráfico e a milícia estão por todos os lados e, com o podcast “A república das Milícias”, do jornalista Bruno Paes Manso, podemos ter a visão de como essas instituições nasceram e encontram caminhos para existir pela cidade.
Durante um dos episódios, o jornalista discorre sobre a existência da “pedagogia de violência”, que se estrutura com as instituições policiais, usando a força e o armamento para criar uma falsa sensação de ordem dentro das favelas.
Porém, surge a dúvida: “Quem eles defendem, com essas atitudes?”. Se durante o fogo cruzado, casos como o de Thiago Menezes, garoto de 13 anos que foi “confundido” com um criminoso enquanto andava pela Cidade de Deus, ou de Heloísa Silva e mais 18 crianças, que foram atingidas por bala perdida no ambiente escolar, se tornaram recorrentes perante a brutalidade das operações policiais na periferia do Rio.
No Brasil, temos vários exemplos de programas em espécie de reality exibidos em TV aberta e que exemplificam como é o trabalho da polícia, sendo ela militar, civil, metropolitana, florestal ou rotam.
A forma que o telespectador assiste o conteúdo construindo uma visão tênue dos fatos, enxergando apenas um bem e um mal. São nesses momentos que bordões, como “bandido bom é bandido morto” ou “depois que a casa cai, não adianta chorar”, são criados e ganham força, podendo sair do imaginário da população para se tornar uma reação a qualquer fato ou circunstância que as leve a recordar do que foi exibido.
A exibição de conteúdos sensacionalistas influencia a reprodução dos discursos de ódio entre seus telespectadores, fazendo com que bordões simplórios banalizem a violência e naturalizem, na sociedade, o uso da força para justificar agressões e reações extremistas.
Os seguintes vídeos, compartilhados pelo UOL, retratam relatos de abordagem policial em que os profissionais não sabem que estão sendo gravados. Nessas situações, crimes como o uso ilegal da coerção ou força no exercício da função estatal de segurança pública são falhas de conduta que não são exibidas em programas de televisão aberta, mas que acontecem muito frequentemente.
Os levantamentos de dados ainda exibem que há grande discrepância entre a abordagem de pessoas pretas e brancas e a intensidade da agressão da violência policia de acordo com a raça.
Com a repercussão dos conteúdos nas redes sociais, a assessoria da polícia e os agentes da força que trabalham na parte de comunicação são acionados para fazer uma retratação na mídia, podendo soltar uma nota ou se pronunciarem com um porta-voz sobre o delito ocorrido.
Entretanto, já é perceptível um padrão desta ação: eles trazem um motivo para a abordagem mais agressiva, uma desculpa formal e uma solução para o ocorrido, alterando pequenos aspectos de caso a caso. Infelizmente, nenhuma retratação formal na mídia pergunta primeiro antes de atirar.
Agressão não é para ser justificada, apenas extinguida da abordagem policial e do sistema carcerário brasileiro.
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O artigo abaixo editado por Maria Cecília Dallal.
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