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Árvores viram “artigo de luxo” e se concentram nas áreas mais ricas de São Paulo

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This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

O termo racismo ambiental ganhou destaque em 2024 após Anielle Franco, ministra da Igualdade Racial, relacioná-lo às fortes chuvas que atingiram o Rio de Janeiro em janeiro deste ano e afetaram principalmente a Zona Oeste da cidade, trazendo prejuízos para a população da região.

Criado na década de 1980, o conceito destaca como injustiças ambientais recaem de forma mais intensa sobre etnias e populações vulneráveis. Inicialmente, o termo foi utilizado pelo líder afro-americano de direitos civis, Benjamin Franklin Chavis, em meio a protestos contra depósitos de resíduos tóxicos no condado de Warren, nos Estados Unidos, onde a maioria da população era negra.

Quando se trata de arborização urbana, o racismo ambiental também revela a sua face. De acordo com Marcos Silveira Buckeridge, professor titular do Departamento de Botânica do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (USP), há menor concentração de árvores em bairros que sofrem com a falta de atenção do poder público, sendo que esses locais são historicamente ocupados por habitantes negros. 

Na capital paulista, o Jardim Ângela é o bairro com maior percentual de pretos e pardos, segundo o Mapa da Desigualdade de 2023, elaborado pela Rede Nossa São Paulo. Quando o assunto é qualidade de vida, o distrito, no entanto, apresenta a sétima menor pontuação geral, entre os bairros da cidade avaliados no estudo.

A tese de doutorado Avaliação da mudança da cobertura arbórea, renda e crime na cidade de São Paulo, da pesquisadora Bruna Arantes, constatou, a partir de imagens de satélite, a distribuição desigual da cobertura arbórea nas zonas mais urbanizadas da capital paulista. O estudo revelou que as árvores estão localizadas nas áreas mais ricas da cidade, enquanto restam aos bairros periféricos apenas as florestas das reservas ambientais. 

Buckeridge destaca que grande parte das árvores está concentrada na região central de São Paulo, onde há também maior aglomeração de renda. Por outro lado, locais muito adensados, como o extremo leste da cidade, carecem de arborização, assim como as favelas. “Isso ocorre porque, durante muito tempo, o poder público não entrou nesses lugares devido à presença do crime organizado.”

A importância das áreas arborizadas

Conforme explica o professor, as árvores trazem diversos benefícios à população, contribuindo para a redução da temperatura e a diminuição do número de doenças por poluição do ar. “Em lugares arborizados de São Paulo, as pessoas podem viver vinte anos a mais. É preciso que a gente tenha mecanismos para informar a população sobre essas vantagens.”

Para se ter uma ideia, na capital paulista, a temperatura pode variar em até 10˚C, desde regiões mais quentes sem áreas verdes até zonas mais frias sob influência de grandes parques e remanescentes florestais. As informações estão presentes na pesquisa Um novo ecossistema: florestas urbanas construídas pelo Estado e pelos ativistas, do programa  USP – Cidades Globais. 

Ainda de acordo com o estudo, as árvores assimilam toneladas de gás carbônico durante o crescimento, contribuindo com a atenuação das mudanças climáticas. Além dos benefícios já citados, esses organismos vivos também contribuem com a redução do escoamento superficial da água da chuva, potencialmente reduzindo os impactos ocasionados por enchentes. 

Mesmo com tantas vantagens relacionadas às árvores, é preciso ter cuidado antes de pensar em políticas públicas de arborização urbana. Os gestores devem, primeiramente, entender as prioridades de cada comunidade. “Eu tive sequências de reuniões com líderes de favelas nos últimos dois anos e percebi que a primeira necessidade deles envolve soluções de saneamento básico. Enquanto uma criança estiver brincando no esgoto, ter mais árvores não vai adiantar nada”, conta Buckeridge.

O professor ressalta, portanto, que antes de pensar na questão da arborização é necessário atender às outras necessidades das comunidades, propondo projetos de educação, saúde e saneamento básico. “Depois de resolver essas demandas, podemos chegar às árvores.”

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O artigo acima foi editado por Camila Lutfi.

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Beatriz Rocha

Casper Libero '24

Estudante de jornalismo na Faculdade Cásper Líbero. Apaixonada pelo poder da escrita, busca aprender sobre novos assuntos e compartilhá-los com os leitores. Com grande interesse por temas relacionados à cultura, gosta de escrever sobre livros, séries e filmes.