Nos corredores acadêmicos, um problema persistente e silencioso vem ganhando destaque: a cultura do estupro.
Ao adentrarmos a realidade universitária, é notória as problemáticas, práticas, mitos e desafios que asfaltam o caminho rumo à relativização da violência sexual.
Mas afinal, o que é a cultura do estupro e como podemos combatê-la?
DESTRINCHANDO O CONCEITO
Em 1970, auge da segunda onda feminista, o termo “cultura do estupro” surgiu para se referir a um conjunto de opiniões, atitudes e práticas que normalizam, justificam ou minimizam a violência sexual.
Esse conceito ganhou relevância no Brasil em maio de 2016, no Rio de Janeiro, onde aconteceu um estupro coletivo que chegou a ser filmado pelos agressores.
As feministas dos anos 70, ao estruturar esse conceito, argumentaram que essa cultura é reflexo de uma estrutura patriarcal, onde os homens detêm o poder e enxergam as mulheres numa posição inferior, trazendo a percepção de que o corpo das mulheres é uma propriedade pública e que nem sempre o consentimento delas é importante.
No ambiente universitário, essa cultura pode se manifestar de várias maneiras, criando um espaço que tolera ou até mesmo encoraja a violência sexual.
CASO UNISA: VIOLÊNCIA E OBJETIFICAÇÃO
Em abril deste ano, em um campeonato de jogos universitários, alunos do curso de medicina da UNISA (Universidade de Santo Amaro) cometeram atos obscenos ao cruzar a quadra seminus durante uma partida de vôlei feminino.
O caso viralizou nas redes sociais apenas em setembro, abrindo o debate sobre os absurdos e atos vexatórios que calouros da universidade são obrigados a se submeter por coerção dos veteranos, para ser parte de grupos e coletivos da faculdade.
“Para nós estudantes é zero surpresa, é que dessa vez houve repercussão, foi para TV e afins, mas nada diferente do que fazem todos os anos. E basicamente, só se ferram os bichos que aceitam e não os que mandam eles fazerem, no caso os veteranos”, diz uma das alunas da universidade de medicina que preferiu não se identificar.
Atitudes como essa cabem dentro da cultura do estupro e trazem a discussão, até quando o espaço e a privacidade das mulheres serão invadidos e desrespeitados? A postura escancara o descaso e desrespeito dos alunos para com as competidoras, revelando que quase de forma inconsciente, quanto mais as mulheres reivindicam espaços, mais elas se tornam alvos suscetíveis para demonstrações de violência.
“Eu culparia mais quem manda os calouros fazerem as coisas do que os próprios calouros. Tipo, eles expulsaram os calouros, mas na minha visão, tinha que ter vindo galera das turmas de cima, que são quem mandam eles fazerem tudo”, acrescenta a aluna.
A punição não durou muito e no final de setembro, a 6ª Vara do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) determinou em liminar a reintegração dos 15 estudantes de medicina que haviam sido convidados a se retirar da instituição.
DESAFIOS E SOLUÇÕES NO AMBIENTE UNIVERSITÁRIO
Em diversos casos, comportamentos e atitudes que deveriam ser vistos como inaceitáveis são tolerados e até mesmo tratados com normalidade. Isso pode incluir piadas ou comentários insensíveis sobre violência sexual, além de desculpabilização dos agressores.
As vítimas desses ataques ou de casos mais graves, como a violência sexual em si, podem enfrentar descrenças e até culpa por parte da comunidade universitária, criando um ambiente opressivo e desencorajador para denúncia. Muitos casos não são denunciados devido ao medo, a vergonha ou até descrença da situação e isso, infelizmente, favorece o ciclo de impunidade que desenvolve e fortifica cada vez mais a cultura do estupro.
O estilo de vida universitário não conta só com a parte acadêmica, mas também de descontração entre jogos e festas, onde havendo um abuso de substâncias como, consumo excessivo de álcool e drogas, acaba se tornando um fator que pode contribuir para a ocorrência de situações violentas, tornando mais difícil para as pessoas avaliarem e comunicarem seu consentimento.
A cultura do estupro não é a mesma em todos os ambientes universitários, há espaços onde ela já está mais desenvolvida e outros em que a instituição e os alunos fazem esforços significativos na intenção de promover um ambiente seguro e inclusivo.
Nos espaços onde isso ainda não é uma realidade, é essencial promover uma mudança profunda nas normas sociais e nos valores da comunidade universitária num todo, incentivando a equidade de gênero, respeito ao próximo e repúdio à violência sexual.
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O artigo acima foi editado por Mariana Cury
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