Segundo pesquisa da ONG Women in Music, 30% das mulheres estão ligadas a profissões no ramo da música. Os cargos vão desde os músicos de apoio de banda até iluminação cênica, recursos técnicos e projeção. No entanto, é comum que festivais em todo mundo componham em número desigual uma maioria de bandas formadas por homens exclusivamente. Quando se trata de mulheres na música, gêneros como o Pop recebem mais destaque feminino, no entanto, você conseguiria se lembrar quantas artistas no indie, punk, rock ou hardcore você conheceu nos últimos anos? Por isso, convidamos Natalia Sá, guitarrista e vocalista da banda Let Me Sing e profissional audiovisual, para conversar um pouco sobre os dilemas de sua carreira no mundo da musica, em especial do rock.
- Como você iniciou dentro do ramo musical e como a guitarra surgiu na sua vida?
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Eu acho que para a maioria dos músicos, a galera começa na igreja, acho que todo mundo tem aquela fase church na vida, sabe? (risos) A minha família sempre foi muito musical, eles sempre gostaram muito de ouvir música, meu avô era seresteiro, também tocava violão e cantava. Eu comecei a cantar com uns três anos de idade, mas aquela coisa de criança, na brincadeira. Só que todas as vezes que eu e minha mãe saíamos para comprar alguma coisa, eu sempre voltava com aqueles violões pequenos de plástico. Eu sempre pedia isso quando perguntavam o que eu queria. Por volta dos 6 anos, meu pai me deu uma guitarra verde de plástico, de brinquedo, e eu não desgrudava. Então, quando eu comecei a ir para igreja com o meu pai, eu cantava no coro infantil, mas sempre quis aprender a tocar. As condições financeiras não eram tão boas, mas com 13 anos de idade eles fizeram um esforço e me deram o meu primeiro violão.
- Você aprendeu a tocar dentro da igreja ou sozinha?
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Eu já tinha feito algumas aulas de teoria musical, mas quando ganhei o violão e fui perguntar se tinha aula disponível na igreja, disseram que não, só estavam precisando de flautista e de violinista. Foi um balde de água fria, então por um tempo eu tentei aprender sozinha, comprando revistinha de cifra ou imprimia as partituras do Cifra Club. Com 14 para 15 anos, meus pais fizeram mais um esforço para pagar as aulas de violão particular para mim com um rapaz, amigo do meu pai de igreja, ali comecei a ter a minha base musical. A primeira música que aprendi tocar foi Como Zaqueu do Regis Danese, uma música muito fácil de quatro acordes e que não tinha pestana. Foi uma cena muito marcante, porque como minhas aulas eram na sala de casa, minha mãe estava na cozinha e ouviu eu tocando e começou a chorar. E depois que aprendi minha primeira música com pestana, Unchained Melody, do filme Ghost, eu já sabia ler de verdade as cifras e evolui mais.
- Hoje, como você concilia a sua rotina com a vida musical?
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Eu nunca consegui viver da música, mas ela sempre fez parte da minha vida com muita força. Dado momento da minha vida, eu era vocalista da Let Me Sing e trabalhava com T.I, mas depois de um tempo, eu me dropei na carreira de informática, porque se tornou algo muito exaustivo. Depois, comecei a estudar audiovisual, que foi sempre algo muito presente desde a época de inventar de fazer CD’s com os primos na brincadeira. Então hoje em dia, eu trabalho como fotógrafa, videomaker e designer. Cantar e tocar se tornaram um hobby, mas com certeza, se rolasse de ganhar dinheiro seria um sonho. É o sonho de todo mundo que toca ou canta e tem uma banda com os amigos.
- Como surgiu a Let Me Sing?
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Lembro de na escola, o sonho com as amigas, era ter uma banda girlpower. Todo mundo era emo, andando de preto em um sol do meio-dia saindo da escola. Ouvíamos muito NX Zero, Fresno, Avril Lavigne, Strike, Charlie Brown, Raimundos, Foo Fighters, Red Hot Chili Peppers, inclusive, o álbum deles, By The Way, foi um dos que eu mais ouvi na vida. Então, a Let Me Sing veio desse desejo de escola. Quando estudei no SENAI conheci algumas pessoas dessa mesma vibe e virei para um amigo e falei: “Bora criar uma banda”, ensaiamos algumas músicas e tocamos em uma festa no condomínio dele. O primeiro nome foi Empty Mind ou Empty Head, não lembro muito bem. Depois tivemos um desentendimento e o sonho ficou um pouco de lado, até mesmo por estar saindo da escola e começando a vida adulta de trabalhar e estudar. Foi trabalhando que comprei minha primeira guitarra e entrei em uma banda por uma plataforma, Forme sua Banda do Cifra Club, mas era uma turma muito nova, o menino da bateria não tinha tanta liberdade de sair para tocar. Comecei a fazer uma audição para procurar uma baterista, mas os outros da banda não foram, então eu cheguei nos caras que foram e falei do meu outro projeto que era a Let Me Sing, e essa foi a primeira formação. Até porque eu tinha ido no show do Paramore e visto a Hayley e isso mudou toda a minha concepção e resgatou a essência que eu queria da Let Me Sing. Foram muitas idas e vindas, muitas audições para achar uma pessoa boa e que fosse parceira, porque nos tornamos muito amigos. Ter banda é tipo casar (risos).
- Quais são os estilos que você mais curte tocar e ouvir? E quais são suas maiores inspirações?
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Escuto muito pop, tanto que meu Spotify todo ano mostra que o que eu mais ouvi foi pop. O TOP 3 fica sempre entre pop, rock e pop-rock. Como vocalista, eu admiro muito a Hayley Williams, que me fez construir uma imagem de frontwoman, de bater cabelo e ela é muito versátil, já como guitarrista curto muito a Juliana Vieira, conheço ela desde que ela tocava na Replace. Uma vez fui em uma balada e ela estava lá e eu tinha uma amiga que sempre me colocava para cantar em qualquer lugar que a gente ia, e eu cantei A sua Maneira do Capital com a Juliana tocando na guitarra.
- A pandemia afetou muito o trabalho de vocês?
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Acabou que a gente não trabalhou, né? Em março de 2020 estávamos finalizando o nosso disco, já na fase masterização das músicas e eu estava indo acompanhar. Dia primeiro de março foi o último dia que fui no estúdio. Comecei a trabalhar no home office e fiquei cinco meses sem sair na rua. Só quando entrou na fase verde que a gente conversou para ensaiar um pouco a cada duas semanas. Ensaiamos e gravamos um clipe, mas tudo voltou a piorar de novo. Entretanto, a pandemia me ajudou a estudar de novo a guitarra, já que tinha focado muito em ser vocalista. Estou a 10 anos nessa entre tocar e cantar.
- Quais foram as principais dificuldades na sua carreira? E você acha que isso foi porque você é uma figura feminina?
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Antes de subir no palco sempre fui muito subestimada, como se não fosse capaz de cantar e tocar. Além de olhar ao redor, muitos dias e noites, e só ver eu de mulher no ambiente e eu me questionava muito, mas sempre que tinha mulheres eu me sentia na obrigação de exaltá-las e trazer a motivação de realizar os sonhos, caso queiram cantar e tocar também. Muitas pessoas pensam que os rockeiros são bem liberais, mas é bem diferente disso, grande parte é conservador e algumas mulheres reproduzem os machismos também. Muitas vezes me sentia mal quando via as fotos da banda depois, por me comparar a outras bandas com meninas mais magras e altas, pelo estereótipo que colocam que quem canta rock é branco, alto e magro. Em outras carreiras, como no T.I, na parte técnica, também só via eu de mulher no ambiente de trabalho, inclusive uma vez em uma entrevista pelo SENAI, o diretor me pediu desculpa quando a empresa retornou um e-mail falando que não tinham pedido candidatas mulheres, aquilo foi um absurdo tanto para mim como para os meus colegas, até porque tinham selecionado as pessoas com as melhores notas para participar da entrevista. Por outro lado, no dia seguinte, quando fui fazer outra entrevista, a empresa achou incrível o fato de eu ser mulher, fui a primeira mulher dentro da minha área na empresa e fui muito bem recebida. Em qualquer lugar, a mulher é sempre muito questionada, e tem que fazer muito mais que os homens para provar que é capaz.
- Por fim, o que você ainda espera para o futuro da sua carreira? Qual é o seu maior sonho ainda a ser realizado musicalmente?
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A pandemia me fez refletir muito e escutar músicas diferentes como as orientais que eu tinha um certo prejulgamento sobre, até mesmo uns anos atrás eu também tinha isso sobre o funk e hoje desço com a raba no chão (risos). Então, acho superimportante diversificar o nosso conteúdo, experimentar novos caminhos inspirados no que esses grupos coreanos podem ensinar, inclusive por eles terem clipes e músicas diferentes e surreais em questão de recursos. Não limitar nosso conteúdo ao que já pertence ao nicho da Let Me Sing. Além de experimentar mais o pop, pelo que sou apaixonada, e deixar um pouco o bate cabelo de lado.
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O artigo acima foi editado por Vitória Antunes.
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