“(…) Vó, Esperança, que trouxe lembrança
Memória de um tempo atrás
Eu descobri a raiz do cabelo
Que veio de Minas Gerais”
O trecho acima compõe a música “Japão” de Dora Morelenbaum, uma das vozes mais bonitas do Brasil que vem chegando. A artista dividiu com a gente experiências sobre suas primeiras criações compartilhadas com o mundo, que se entrelaçam e derivam de suas vivências pessoais. Neste primeiro EP estão contempladas as músicas, “Japão”; “Avermelhar” e “Vento de Beirada”, todas, de acordo com ela, particularmente especiais.
Dora, artista de 25 anos, veio de um lar de músicos renomados nesse meio, sendo seu pai o violoncelista e maestro Jaques Morelenbaum e sua mãe a cantora Paula Morelenbaum, dupla que trabalhou com grandes nomes, como Tom Jobim e Ryuichi Sakamoto. “Meus pais são com certeza minha maior inspiração, eles sempre me apoiaram em questões gerais, então crescer no meio artístico, acompanhar o trabalho deles e eles acompanharem o meu foi um processo natural. Eu considero a minha criação até privilegiada porque acaba que eu não cresci e acompanhei apenas eles, mas também todos com quem eles fizeram parceria.” Ela também comenta a sorte que tem em carregar o sobrenome Morelenbaum, pois indaga a curiosidade e expectativa do público em conhecer seu trabalho.
A sua criação musical e técnicas vocais dizem muito sobre sua trajetória na música. Ela conta: “Eu comecei a fazer realmente aula de canto muito recentemente, apesar de que quando mais nova, eu me formava muito de ouvido, até porque eu acredito que a audição é um estudo, então eu acabava estudando sem saber, ouvindo meus pais cantarem, cantando em corais da escola e essas coisas. Então, essa minha vontade de entender esse lugar da técnica e encorpar de fato ao meu trabalho é mais recente, buscando chegar em lugares que eu gostaria.”
Quando questionada sobre sua vontade de estrear, respondeu: “O momento em que eu entendi que eu realmente queria produzir um EP foi quando eu comecei a encarar minhas composições. A ideia inicial era gravar músicas inéditas de alguns amigos, eu ia atrás das pessoas e comentava sobre, mas nada disso era um grande incentivo pro pontapé inicial. Até o momento que eu passei a observar as minhas próprias produções, que inicialmente eram só pra mim, e sentir vontade de compartilhá-las. Eu mantive só uma música desses meus amigos no EP, que é justamente a “Vento de Beirada”, essa é a única que não é minha.”
Sobre “Japão”, música inspirada em uma viagem que fez com a família, ela declara: “Japão, pra mim, é uma mistura de fios de memórias e histórias que me compõem e eu fui resgatando pra chegar num lugar musical íntimo, um resgate de referências tanto musicais quanto de vida mesmo”. Conta como, com sua possível ingenuidade de criança, se sentiu em casa, mesmo num país tão diferente. Para ela, eram só pessoas “falando diferente”, sendo criança, não enxergava com a malícia dos adultos, um presente.
“Japão” é um entrelaço de emoções e descobertas, sendo parte dela inspirada em sua avó. Dora sempre se questionou sobre a origem de seu cabelo cacheado, sobre quem de fato era. E foi em uma conversa com a avó que teve um momento catártico de grandes descobertas e entendimento. “Foi muito incrível descobrir esse meu lugar. Eu me perguntava de onde vinha o meu cabelo cacheado e quando eu saquei, muitas coisas se encaixaram. Não é só meu lado judeu que existe, eu tenho muito mais história do que isso. Foi muito interessante.”
O sentimentalismo e a conexão ancestral e familiar estão bastante presentes nas produções de Dora, uma prova disso é a canção Dó a Dó, lançada em 15 de outubro de 2020. Parceria com Tom Veloso e arranjos do pai, Jaques Morelenbaum, ela conta: “A história dessa música é muito legal – o Tom me mandou a letra dela no meu aniversário há uns 3 anos enquanto eu estava numa viagem com meus pais, daí eu mostrei essa e mais uma outra música que estava fazendo na época pro meu pai, e essa em especial ele disse que eu precisava gravar. Então nos encontros que eu tive com o Tom pela produção da música, eu comentava que ela precisava de um arranjo de cordas e, obviamente, eu não confio em ninguém mais além do meu pai pra montar um arranjo desses. Eu fui a única que podia dar pitaco nos arranjos dele.” brincou a cantora.
Por fim, retomando o EP, pelo story de seu Instagram a cantora explicou o que é a sensação de um vento de beirada. De acordo com ela, é como o que a gente sente antes de arriscar, ou a sensação de quando percebemos que estamos apaixonadas, cada uma de nós já sentiu esses ventos de beirada. Assim, Dora nos contou que o vento de beirada que almeja sentir é a sensação de estar em cima do palco, sentindo o medo delicioso do incerto e a esperança de propor a diversão de volta, passado o momento caótico em que vivemos. Por enquanto, fica como sugestão de refúgio em meio ao caos, esse EP sensível e tocante e essa promessa de pessoa e de artista.
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O artigo acima foi editado por Angela C. A. Caritá.
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