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Doutor, Me Explica! | Covid-19: A Perspectiva De Uma Médica Na Linha De Frente

This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

Em entrevista à Her Campus Cásper Líbero, Viviane Zveiter de Moraes fala sobre rotina, sentimentos e expectativas após quase um ano e meio de pandemia

Lá se vai quase um ano e meio de pandemia. Quando tudo começou, nós nem imaginávamos o que estava por vir — uma quarentena que se estende por mais de um ano, restrições que quase nos levam à loucura e, acima de tudo, um medo onipresente, alicerçado nas quatro milhões de mortes ao redor do mundo, sendo mais de 500 mil só em nosso país. Em abril, vivenciamos o pior momento da pandemia de Covid-19 no Brasil, ultrapassando quatro mil óbitos em 24 horas.

Nesse cenário, é impossível não pensar nos profissionais de saúde que atuam na linha de frente do combate à maior crise sanitária do século XXI. Travando uma luta diária contra nosso inimigo invisível, eles inevitavelmente assumem traços heroicos. Mas não podemos nos esquecer de que eles são, antes de mais nada, humanos como nós. Para falar sobre Her Campus Cásper Líbero entrevistou Viviane Zveiter de Moraes, médica especializada em terapia intensiva e atuante na linha de frente no combate ao novo coronavírus em Piracicaba, no interior de São Paulo. Ela nos conta como é a rotina de trabalho, quais os sentimentos envolvidos e suas expectativas para o futuro próximo.

Montanha-russa

“Pesada” é como Zveiter descreve a rotina de atendimento aos casos do novo coronavírus. Segundo ela, cuidar de pacientes com Covid-19 é uma verdadeira montanha-russa, seja devido às explosões de casos, seja por causa do quadro volúvel de muitos pacientes, que melhoram e pioram reiteradas vezes.

Além disso, em muitas das situações o paciente já tem comorbidades, o que torna o tratamento mais longo. “Os casos mais graves, muitas vezes, têm vários picos de piora que conseguimos reverter, depois outra coisa complica, volta a estabilizar. “É desgastante”, conta.

“Ao mesmo tempo, conseguíamos ver resultado, então sentia que não tinha que entregar os pontos, precisávamos insistir, valia a pena porque alguns [pacientes] tinham resultado”.

No momento atual, em que a pandemia parece arrefecer um pouco, os profissionais da saúde puderam ter um respiro. Zveiter diz que as últimas três semanas foram uma espécie de descanso, já que o número de casos diminuiu e a gravidade dos quadros, também.

Emocional, física e mentalmente desgastante

Zveiter afirma que a quantidade de casos maior do que os hospitais dão conta provoca uma sensação de impotência. “A gente não conseguia finalizar o dia tendo visto todos os que precisavam. Nunca tinha vivido isso antes, e acredito que muitos colegas também não”.

Recentemente, a doença passou a atingir mais pessoas jovens, chegando a infectar — e, muitas vezes, matar — vários membros de uma mesma família simultaneamente. Zveiter conta que lidar com isso é cansativo e traz muito sofrimento. “Nessa última onda tivemos pacientes mais jovens, gente que não tinha nenhuma outra doença, [o quadro] ficou muito grave e não tinha mais jeito, deixou filho pequeno. Tudo isso mesmo internado em bons lugares, com todos os cuidados”.

Falta de continuidade

Zveiter afirma que o descompasso entre os governos estadual e federal impactaram negativamente o combate ao novo coronavírus. Equipes foram treinadas para lidar com a Covid-19 nos momentos emergenciais, mas, ao final do treinamento, por falta de contratos, essas equipes foram desmanchadas, resultando num enorme desperdício de mão de obra qualificada. “Precisávamos começar do zero de novo. Não se otimizou o recurso existente que foi conquistado ao longo de meses de muito esforço. Podíamos ter aprendido mais com as medidas sanitárias, podíamos ter tido vacina antes, ter aproveitado pessoas qualificadas. A gente se ajudava muito se treinando, passando de um para outro. Não conseguíamos ver uma coisa estruturada para fazer aquilo de um jeito muito mais produtivo”.

Segundo ela, em momentos como o que vivemos, é fundamental um alinhamento dos líderes nacionais, deixando o discurso político de lado e se pautando pela ciência. “Tem gente [os cientistas] que estuda, que sabe apontar caminhos. É preciso respeitar isso. É hora de valorizar as vidas. Infelizmente, acho que o que vemos é uma banalização da morte de algumas pessoas, sobretudo dos mais desfavorecidos”.

De volta ao normal?

Atualmente, observamos uma movimentação voltada para o relaxamento das restrições, com a reabertura de muitos estabelecimentos e a flexibilização de medidas de distanciamento. No entanto, Zveiter acredita que este não seja o momento de seguir nessa direção. “Acho que ainda é cedo para festejar. Temos uma calmaria, mas já vimos essa calma em outros momentos e depois o que aconteceu não foi nada tranquilo. Já aprendemos que há surpresas com essa doença e com esse vírus. Acho precoce, tem gente que pode chorar por causa disso”.

Segundo Zveiter, os profissionais da saúde estão prontos para trabalhar e pôr a mão na massa, mas é preciso cuidar para que a situação não volte a piorar. A médica reforça que é imprescindível seguir com as medidas sanitárias básicas, como usar máscaras adequadamente, evitar aglomerações e higienizar as mãos frequentemente, com água e sabão ou álcool em gel 70%, a despeito dos exemplos negativos que possam vir de lideranças negacionistas.

Vacinar é preciso

Zveiter relembra que a vacina reduz os riscos de casos graves, e que, para ter eficácia, deve ser administrada coletivamente. “Até entendo as pessoas que não gostam de tomar vacina, mas é importante que nesse momento essas pessoas entendam a importância para o coletivo. É uma atitude de cidadania”.

A médica ainda reforça a importância da vacinação mesmo para quem já teve Covid-19. “A imunidade da doença dura por uns meses, daí a ideia de usar a vacina para quem já teve Covid também. Eu mesma tive Covid em maio do ano passado e me vacinei também”, conta.

Estamos todos cansados e com saudade da vida normal. Mesmo assim, se quisermos combater o vírus, não podemos vacilar. Quando tivermos vontade de jogar tudo para o alto, devemos pensar nos profissionais da linha de frente que têm trabalhado exaustivamente para nos ajudar, expondo-se a riscos inimagináveis para que nós não precisemos fazer isso. Este texto é um agradecimento a todos e a cada um deles.

I’m a writer and Journalism student at Cásper Líbero. Besides writing and reading, I’m fascinated by culture, arts and wellness.