“Vocês vieram conhecer o museu de Bacurau? Esse museu é muito bom”. Essa é uma das falas que me fez ficar pensativa ao assistir o filme que todo mundo – ou ao menos uma grande parcela do nosso país- ouviu falar. Bacurau, uma cidade pequena, isolada, que nem no mapa aparece, tem um museu, e a explicação me pareceu simples: Todo mundo tem uma história. E ao pensar nisso, na história de uma cidade, de um estado ou de um país, refleti sobre o que o Grande Prêmio do Cinema Brasileiro representa.
A maior premiação de cinema e arte audiovisual do nosso país aconteceu no domingo, 11 de outubro, com transmissão da TV Cultura. Em meio a uma pandemia, onde tudo parece confuso e até um pouco sem sentido, o prêmio trouxe aquilo que descobrimos – ou percebemos – não podemos viver sem a arte e a cultura.
A 19º edição do prêmio decidiu homenagear não apenas uma personalidade, mas os profissionais do audiovisual como um coletivo. Dentre as 32 categorias, “Bacurau”, obra de Kléber Mendonça Filho, e “A Vida Invisível”, de Karim Aïnouz, lideraram as indicações; foram 15 para o primeiro e 14 para o segundo. “Simonal”, de Leonardo Domingues, foi o terceiro mais indicado, com 10 aparições na lista. Não é à toa que foram os donos da noite.
- Melhor Atriz Coadjuvante
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E o prêmio foi para a grandiosa Fernanda Montenegro no papel de Eurídice Gusmão em “A Vida Invisível”. Ela participa dos minutos finais do longa, interpretando a versão mais idosa da personagem de Carol Duarte.
O filme, que também levou a estatueta por melhor roteiro adaptado, conta a história de duas irmãs. Eurídice e Guida (personagem de Julia Stockler). Filhas de pais portugueses e conservadores, as duas acabam se distanciando ainda jovens e a trama se desenrola na angústia de encontrar uma a outra. Um filme não apenas sobre desencontros, mas também sobre suas entrelinhas: “Melhor reclamar muito não, hein? Mulher como tu devia tá trabalhando em outro lugar”. O papel da mulher, a família patriarcal, a autoridade do homem. Assuntos da época em que a trama se passa e assuntos de hoje, atemporais.
O filme, que foi até cogitado a representar o Brasil no Oscar 2020, levou 5 das 14 categorias que disputava, incluindo também melhor roteiro adaptado, melhor figurino, melhor direção de arte e de fotografia.
- Melhor Ator Coadjuvante
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O Troféu Grande Otelo de melhor ator coadjuvante foi para Chico Diaz, como Véi Gois, por “Cine Holliúdy – A Chibata Sideral”. O filme do cearense Helder Gomes também levou o prêmio de Melhor Longa-Metragem Comédia e concorria com o último filme da trilogia de “Minha Mãe é Uma Peça”.
“Cine Holliúdy 2” quando foi para os cinemas cearenses superou a bilheteria de filmes com ‘super-heróis’ estadunidenses. O poder da representatividade de um povo na tela; nos Estados Unidos pode ser a “Capitã Marvel”, no Brasil, é Francisgleydisson (personagem de Edmilson Filho) e os moradores de Pacatuba, uma pequena cidade no interior do Nordeste. O longa trata da dedicação do personagem principal de driblar a concorrência com a televisão e os filmes de Hollywood. Mesmo com o cinema da cidade fechado, os moradores daquele nordeste interiorano não largam a mão da arte e decidem produzir um filme. O tema? A luta de Lampião contra os invasores marcianos. Uma comédia de outro mundo.
- Melhor Filme Infantil
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Para aqueles – como eu – que cresceram lendo sobre a menina briguenta, baixinha e dentuça, sua amiga comilona, o colega que não gosta muito de água e o amigo que fala meio ‘elado’, “Turma da Mônica- Laços” entrega aquilo que queríamos ver: os personagens tomando vida.
Delicado e especial, definitivamente não é apenas um filme infantil. É a arte e a cultura brasileira sendo levadas adiante, em outros formatos, mas com a mesma essência contagiante que a turma de Maurício Souza tem nos quadrinhos.
Outro filme voltado ao público infantil que ganhou o Troféu Grande Otelo foi “Tito e os Pássaros”, de Gustavo Steinberg, Gabriel Bitar e André Catoto, vencedor do prêmio de Melhor Longa-Metragem de Animação.
- Melhor Ator
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Um empate! Silvero Pereira como Lunga por “Bacurau” e Fabrício Boliveira como Wilson Simonal por “Simonal” dividiram o prêmio de melhor ator.
O personagem de Silvero Pereira toma a cena e faz de “Bacurau” o que é. Enquanto Fabrício Bolivera dá vida ao personagem que leva o nome do filme. A biografia de Wilson Simonal relembra a época difícil da censura e da ditadura no país, e o racismo presente de forma descarada na sociedade – “É proibido músico na piscina, Simonal. Ainda mais crioulo como você”.
Simonal também foi um dos destaques da noite, levou melhor primeira-direção, melhor trilha sonora e melhor som.
- Melhor Atriz
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O prêmio foi para Andrea Beltrão no papel de Hebe, por “Hebe- A Estrela do Brasil”. Um filme que fala sobre censura, Andrea interpretou a apresentadora que falava tudo o que pensava e batia de frente com a ditadura enquanto trabalhava na Band e no SBT. Apesar de parecer um filme biográfico, que conta a história dos 83 anos de vida da Hebe, o foco foi na luta de apresentar sem ser censurada.
Ainda assim, o filme mostra uma Hebe que é mãe, tia e amiga, longe dos holofotes e das câmeras. E também uma apresentadora que bebe demais e beija de menos – coisa que na Hebe que conhecemos era uma de suas marcas registradas.
A obra também recebeu o prêmio de melhor maquiagem.
- Melhor Curta-Metrage Ficção
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Apesar de todas as categorias de um prêmio que celebra o cinema brasileiro serem importantes, o melhor curta-metragem premiou uma história importante. A categoria indicou apenas curtas dirigidos por mulheres. O que deveria ser algo comum, está longe de ser visto com frequência. A diretora que levou o Troféu Grande Otelo foi Renata Martins, por “Sem Asas”. O filme de 20 minutos conta a história de Zu (Kaik Pereira) e trata de uma metáfora; a sinopse do filme diz: “Zu é um garoto negro de doze anos. Ele vai à mercearia comprar farinha de trigo para a sua mãe e, na volta pra casa, descobre que pode voar”. Para entender, só assistindo (e refletindo).
O curta completo pode ser assistido aqui!
- Melhor Longa-Metragem Ficção
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O prêmio de melhor longa-metragem, como esperado e merecido, foi para “Bacurau”. O filme que todo mundo já ouviu falar, mas ninguém sabe sobre o que é, leva essa fama pela sua essência. Falar pouco sobre ele, já é falar demais. Não tem como explicar em palavras o que Kléber Mendonça Filho e Juliano Dornelles fizeram para as telonas, a tradução para palavras escritas não faz jus ao longa, que conta com Bárbara Colen, Silvero Pereira e Sônia Braga em seu elenco.
A obra foi a dona da noite, levando 6 das 15 indicações. Os prêmios foram de melhor direção, melhor roteiro original, melhor montagem de ficção e melhor efeito visual, além de melhor ator e melhor longa-metragem ficção.
Bacurau tem um museu. Um museu muito bom. E o Brasil tem esse prêmio, que celebra o cinema nacional, que fala sobre a nossa história, a nossa cultura e a nossa arte.
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The article above was edited by Mariana Miranda Pacheco.
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