Tendo representado o Brasil na corrida pela Palma de Ouro no Festival de Cannes em maio deste ano, onde foi ovacionado por 12 minutos seguidos, além de ter aberto o Festival de Gramado, evento de cinema mais importante do Brasil, Motel Destino, filme dirigido por Karim Aïnouz e protagonizado por Fabio Assunção, Nataly Rocha e Iago Xavier, estreou nesta quinta-feira (22). O longa-metragem marca a volta do diretor – conhecido por seus trabalhos em A Vida Invisível e O Sol de Suely – às produções nacionais, usando a cidade Beberibe, localizada no litoral cearense, como cenário de uma trama dividida entre encontros, sexo e tensões.
A história começa com Heraldo (Iago Xavier), um jovem de 21 anos que busca abrigo em um motel beira de estrada chamado Motel Destino, o qual já havia frequentado anteriormente após se tornar alvo de uma mafiosa da região para quem trabalhava. Ao chegar no estabelecimento, Heraldo suplica à Dayana (Nataly Rocha), dona do motel, e ao seu marido, Elias (Fabio Assunção), por um quarto.
A cena não apresenta muitas falas, mas se as bocas se calam, os olhares gritam na tela do cinema enquanto os dois se observam – desde o momento em que Dayana considera o pedido do jovem até o instante em que abre o portão para que ele possa entrar. É daí que nos deparamos, ao ser declarada por uma comunicação inaudível, com uma pergunta especial que tende a ser respondida durante todo o filme: “Porque Dayana aceita ajudar Heraldo?”
Logo após a chegada do jovem ao estabelecimento, nos é apresentado Elias, um homem aparentemente compreensivo e aberto às escolhas da esposa, mas não é necessário muito tempo de tela para que esse gozo caia por terra. Elias é o único personagem não nordestino dentro da trama e mostra um grande interesse em possuir e prender animais. Dayana, por sua vez, parece ser vista da mesma forma, um outro animal qualquer o qual ele pode manter sob seu controle e comprovar sua posição de superioridade, deixando evidente um relacionamento tóxico e abusivo conduzido pelo sulista dentro do casamento.
Ao desenrolar do enredo, Heraldo e Dayana iniciam um romance às escondidas, enquanto a câmera segue os amantes pelos corredores apertados do motel mantendo uma tensão quase que sufocante. O que antes parecia um relacionamento incerto e desconfiado passa a ser um encontro de semelhantes, uma ligação de indivíduos desamparados que se tornam cúmplices. Enquanto Dayana sente a necessidade amedrontadora de se separar da figura de seu marido, Heraldo sente a necessidade de driblar um futuro predestinado. Logo, o que antes servia como um refúgio onde ambos conseguiam se esconder, compartilhar e manter segredos e confissões, passa a ser uma encruzilhada.
Karim promete e consegue criar um novo gênero cinematográfico, o pornonoir, juntando de forma balanceada e autêntica o cinema noir, acompanhando uma atmosfera sombria e narrativa não-linear, com a pornochanchada, um gênero brasileiro carregado de erotismo escancarado; isso tudo enquanto apresenta a esperança dos personagens em mudar a rota de seus destinos durante a construção de apoio entre Dayana e Heraldo. Seguindo o longa, percebe-se Elias perdendo sua posição de colonizador, que ao decorrer do desenlace do relacionamento de sua esposa e do fugitivo enquanto os amantes transbordam desejo e prazer, é ridicularizado dentro do seu próprio território, como um rei perdendo seu trono.
Gravado em película, Motel Destino apresenta uma fotografia áspera, com cores fortes, vibrantes e saturadas, que seguem o roteiro e o ritmo de cenas eletrizantes. O longa ainda faz o uso do vermelho para traduzir a agressividade em detrimento do desejo e dos prazeres, e o azul e roxo como forma de expressar a conquista e o mistério.
Passando-se quase que inteiramente dentro do motel, o ambiente se torna uma espécie de cativeiro, causando um sentimento claustrofóbico que aumenta a temperatura do local. Moldado a partir de uma subjetividade quase invisível, também se utiliza do conjunto de uma atuação irreprovável por parte dos atores e um jogo de câmera e corpos alinhados. Quem assiste ao filme sente-se confidente do segredo de Dayana e Heraldo, assim como enganado pelos interesses de Elias no interior de um íntimo terreno de ilegalidades.
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O artigo acima foi editado por Fernanda Alves.
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