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This article is written by a student writer from the Her Campus at Casper Libero chapter.

A tempos me encontro presa em um vicioso ciclo de iniciar uma leitura e abandoná-la pela metade. Vamos ser sinceros, chegar a metade é quase um recorde. Entretanto, como qualquer fã de Rita Lee (1947-2023), assim que anunciado, seu mais novo livro ‘Outra autobiografia’ foi prontamente adicionado à minha lista de prioridades. Um livro no qual a artista segue a mesma linha de sua primeira autobiografia (‘Uma autobiografia’, lançada em 2016), desta vez com enfoque nos últimos três anos pandêmicos, é imperdível para qualquer um que a conheça.

Rita Lee Jones de Carvalho foi uma das maiores referências musicais no Brasil, tanto no rock quanto nos mais diversos gêneros que compõem o cenário musical brasileiro. A padroeira da liberdade, como ficou conhecida, foi capaz de construir uma carreira que será lembrada daqui muitas gerações. Além de cantora, a artista também era compositora, instrumentista, escritora e ativista. Durante toda sua trajetória, Rita utilizou de sua voz para protestar incisivamente sobre temas políticos e sociais, assim sendo muito aclamada e recebendo recorrentes homenagens do mais variado público. 

Com seu falecimento no dia 9 de maio, em decorrência de um câncer de pulmão diagnosticado em 2021, o livro, que já havia sido anteriormente anunciado, inevitavelmente recebeu um grande aumento na procura. Lançado no dia 22 de maio, dia de Santa Rita de Cássia, a obra estreou na lista de mais vendidos logo após sua primeira autobiografia voltar ao topo dos rankings

Nessa nova autobiografia, a rainha do rock nacional se permite ser vulnerável e não poupa detalhes do tratamento a que se submeteu. Fala sobre sua rotina, as adaptações que teve de fazer devido a doença, os seres espirituais do Universo e seus avisos, de seres de luz e, principalmente, do caminho que sua vida tomou durante os tempos pandêmicos aos quais todos foram submetidos.

“Com franqueza e honestidade – marcas registradas de sua escrita –, Rita pariu um novo livro autobiográfico que vai mexer profundamente com o leitor. […] Este livro é um ato de coragem, que só não é superior ao amor por seu público. Afinal, foi a ele que Rita quis contar, tim-tim por tim-tim, o que aconteceu”, nas palavras de Phantom, fantasminha que “assombra” as autobiografias de Rita com fatos e curiosidades, escrito pelo filho/editor/melhor amigo da cantora, como descrito por ela mesma.

(p. 191 de ‘Outra autobiografia’)

DE ENCONTRO COM RITA

Vamos sem pressa, antes de falar um pouco mais sobre o livro, permita-me navegá-lo pelos acontecimentos que me levaram a sua leitura: como citado, me encontro em uma espécie de “ressaca literária”. Assim, tendo plena noção de que essa nova obra da artista tinha grandes chances de ficar estagnada em minha estante ao lado de tantos outros livros abandonados (o que, convenhamos, seria praticamente um desaforo contra a Rita), optei por não adquiri-lo durante sua pré-venda.

Porém, ainda com a plena consciência de que no exato momento que me deparasse com sua versão física, ao vivo e a cores, como costumo brincar, não resistiria. E foi exatamente o que aconteceu. 

Em uma tarde de sábado, após um café com alguns familiares, entrei em uma livraria, de forma despretensiosa, como gosto de fazer – existe um certo aconchego ao caminhar entre seus infinitos corredores, livre, não? Em menos de um minuto me deparei com uma mesa inteiramente dedicada às obras literárias da cantora, certamente não deveria esperar menos que isso. Peguei a nova autobiografia em mãos e soltei um dos meus costumeiros efeitos sonoros acompanhado de algum tipo de onomatopeia, encantada e desacreditada por estar segurando um novo pedacinho de Rita em minhas próprias mãos. Folheei e o devolvi no lugar, estranho.

Dei alguns passos em direção a outra sessão mas logo voltei a consciência e retornei ao altar literário dedicado à artista, peguei uma edição e não larguei mais. Acredito que o desfecho seja óbvio – o livro foi comprado. 

Livros da cantora brasileira Rita Lee expostos na vitrine de uma livraria.
Photo by Anna Clara Godoy

Contrariando todos os recorrentes cenários, e até batendo um certo recorde, o li em menos de três horas. Assim que me sentei com ele em mãos, não fui capaz de largar até terminar. Fui imersa de uma maneira surreal. Rita tende a ter esse efeito sobre mim, imagino que em milhões de outros que se sentem tocados pelas obras da artista também. É um sentimento que se assemelha com um abraço, talvez ainda mais forte. Enfim, li o livro de cabo a rabo. Ora me emocionando, ora caindo na risada com o jeito único e satírico da cantora. 

Por ter o costume de fazer anotações em tudo que é lugar, sempre carrego um estojo de lápis e canetas. Dessa vez, quando mais precisava, ele havia sido esquecido em casa. A solução encontrada foi tirar fotos dos trechos que conversavam comigo, de vez em quando também me recorrendo ao bloco de notas. Foram 59 fotografias no total, acompanhados de 22 tópicos anotados.

A partir delas, ficou ainda mais claro tamanha importância e aprendizado que podemos levar desta figura tão marcante para, não só o cenário musical, como para o cenário cultural no geral. E, ainda mais importante, o quanto Rita Lee era humana e se permitia ser. Uma verdadeira inspiração.

ENSINAMENTOS DE RITA

Realmente acredito que temos muito o que aprender de Rita Lee. O legado deixado pela artista não é à toa, não se deu de uma hora para a outra, o que é, mais uma vez, comprovado através das passagens de “Outra autobiografia”. A  cada virada de página, a cada nova frase lida pelos olhos que urgem de mais de um gostinho da cantora, descobrimos um pouco mais não somente da artista, mas também de nós mesmos.

“Ser careca é adotar diferentes hábitos, outros eus dentro de mim, uma pessoa dentro do nosso ego inferior que é a gente mesmo. O mais transformador foi, sem dúvida, ficar pela primeira vez desde que nasci sem franja, que é a mesma coisa de estar pelada no meio da avenida Paulista e todos rirem de mim”

(p. 92 de ‘Outra autobiografia’)

Durante o livro acompanhamos novos auto descobrimentos dela, novas autoaceitações e batalhas. A luta contra reemergentes crises de pânico, por exemplo, se mostra muito presente: “Em casa, a vida era um ócio, um ócio criativo, mas preguiçoso. Minha ansiedade para retornar a escrever, ler, ver TV e levar uma vida como se nada houvesse não durava muito na bonança porque logo vinha a tempestade de um pânico, o que fazia que Rob, Juca e enfermeira A viessem me socorrer. Quando passava a crise, eu morria de vergonha por ter me mostrado tão descontrolada.” (p. 66)  

A conexão e imersão na obra só é possível pois a artista permite-se ser vulnerável e honesta. Seja para tratar de tópicos cotidianos, do passado, ou tópicos mais difíceis, que exigem maior vulnerabilidade, como na página 71 ao contar que “(…) Depois de passar cinquenta anos me chacoalhando no palco e perdendo um quilo e meio por show, lá estava eu, uma caveirinha, tentando andar pela sala sem cair. Patético.”, Rita Lee sempre se mostra humana e verdadeira. 

Mais para o final da obra (sim, infelizmente, tem um fim), ainda é carinhosa o bastante ao deixar um recado especial para o público jovem. Assim, gostaria de usá-la para finalizar essa “desculpa para falar da minha cantora favorita” em formato de texto, para quem quer que precise escutá-la. Rita diz o seguinte:

“Queria dar beijinhos e carinhos sem ter fim nessa moçada dizer a ela que a barra é pesada mesmo, mas que a juventude está a seu favor e, de repente, a maré de tempestade muda, fazendo o barquinho seguir até sua ilha deserta e ensolarada de amor. Diria também para não planejarem nada a tão longo prazo, que a frustração pode assombrar; o que não significa não ter sonhos, apenas que eles não caem do céu” 

(p.124 de ‘Outra autobiografia’)

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O artigo acima foi editado por Mariana Miranda Pacheco.

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Clara Rocha

Casper Libero '26

brazilian journalism student at cásper líbero and senior editor at HCCL! contact at: annacgrocha@gmail.com :) | portfolio: acgrocha.com