Se você é usuário das redes sociais, é provável que já tenha se deparado com uma foto do Papa Francisco utilizando um casaco acolchoado branco, ao invés de sua tradicional batina, imagem essa gerada pelo programa Midjourney. Se não foi seu caso, talvez tenha sido aconselhado por um amigo a delegar alguma tarefa ao ChatGPT para poupar tempo.
Nos últimos meses, a Inteligência Artificial furou a bolha e pegou todos de surpresa pela sua elevada capacidade de imitação de habilidades humanas. Todavia, por maior que tenha sido o choque, o uso de ferramentas amparadas na última geração de IA já começa a fazer parte do dia a dia de vários estudantes e trabalhadores.
Por isso, já surgem alguns questionamentos… Quais serão os efeitos disso a curto e a longo prazo? Ficaremos mais burros? Seremos dominados pela Inteligência Artificial? Qual a reação dos governos mundiais?
O que é o ChatGPT?
O ChatGPT é uma ferramenta de processamento natural de linguagem lançada pela Open AI, startup de tecnologia estadunidense fundada em 2015 por um grupo de investidores, entre os quais, estavam Elon Musk, que vendeu a sua participação na empresa em 2018, e Sam Altman, hoje CEO e principal figura do empreendimento.
A interação com o programa se dá por meio de um chatbot, uma espécie de robô virtual, que recebe as demandas escritas pelo usuário. Então, seleciona as palavras-chave daquele texto e as procura em sua base de dados, que consiste em vários sites espalhados pela internet. Depois, exibe as combinações de palavras mais frequentes, organizadas sintaticamente.
Para que a inteligência artificial consiga dar respostas pertinentes, é preciso que ela seja treinada. Esse trabalho é feito manualmente por milhares de profissionais subcontratados, que se encontram principalmente no hemisfério sul. Conhecidos como data taggers, eles são responsáveis por rotular conteúdos para que a máquina possa reconhecê-los e construir padrões. São esses trabalhadores também que interditam materiais considerados inapropriados, que, por exemplo, contenham violência, da base de dados da IA. Em função disso, frequentemente entram em contato com o que há de pior na internet.
Principais perigos relacionados à inteligência artificial
Um dos maiores temores em relação à inteligência artificial diz respeito a como ela impactará o processo de aprendizagem.
Capaz de responder perguntas de qualquer matéria, incluindo aquelas que envolvam números, e de escrever redações sobre os mais diversos temas, o ChatGPT tem sido um facilitador para os estudantes na hora de fazer tarefas e de resolver provas. Mas a que custo?
A neurocientista brasileira Suzana Herculano, professora da Universidade de Vanderbilt, localizada em Nashville, no Tennessee, Estados Unidos, comentou sobre os prejuízos da delegação de atividades escolares à IA em entrevista ao Valor Econômico:
“Quando você delega o processo a um terceiro, você não está mais usando o seu cérebro. O ser extraordinário que gostamos de pensar que somos é o que o fazemos com o cérebro que temos e é o que fazemos ao longo da vida (…) Se você está em um processo de aprender a descobrir padrões, de aprender fórmulas, de aprender a pensar e a processar informação de uma maneira que produz conhecimento, delegar isso para um algoritmo quer dizer que você está abrindo mão de produzir o seu próprio conhecimento”.
Diante disso, a rede pública de escolas de Nova Iorque proibiu o uso do dispositivo em salas de aula, ainda no ano passado.
No entanto, especialistas apontam que a proibição não é o método mais eficiente para lidar com o problema, na medida em que sempre haverão formas de burlá-la e que será muito difícil manter a inteligência artificial fora das escolas. Segundo eles, inevitavelmente, uma mudança no sistema de avaliação educacional será necessária, assim como a conscientização dos alunos acerca dos prejuízos para o aprendizado.
Outra polêmica diz respeito ao plágio. O ChatGPT funciona a partir de notícias, livros, blogs e outros textos divulgados na internet. No entanto, ao revelar o output para o usuário, não há menção nenhuma de autoria. O Midjourney, programa de geração de imagens por IA, responsável pela foto do papa com o casaco puffer, também utiliza imagens veiculadas online para funcionar sem dar créditos.
Yuri Lima, pesquisador do Laboratório do Futuro da Universidade Federal do Rio de Janeiro, comentou sobre a questão do plágio em depoimento à BBC Brasil:
“Em áreas criativas, esse reconhecimento dos autores é considerado importante. Além disso, não conhecer as fontes dificulta o reconhecimento de vieses ou até mesmo de mentiras, como em notícias falsas”.
A falta de esclarecimento em relação às fontes utilizadas pelo Chat GPT e a quais dados estavam sendo manipulados fez a Itália banir o uso da ferramenta, sob alegação de violação de privacidade, em 31 de abril.
Um dia antes, mais de duas mil pessoas influentes do ramo tecnológico, incluindo Elon Musk e Steve Wozniak, cofundador da Apple, assinaram uma carta feita pelo instituto Future of Life pedindo uma pausa de seis meses no desenvolvimento da inteligência artificial para que se possa estudar melhor os possíveis impactos dela na sociedade. O documento alerta para os riscos da tecnologia, principalmente, no que diz respeito à obsolescência do homem perante a máquina e também o grande potencial para a geração de desinformação e fake news.
A perda de empregos é também uma grande preocupação relacionada ao avanço da inteligência artificial. De acordo com relatório publicado pelo banco alemão-americano Goldman Sachs em 26 de março, até 300 milhões de empregos em todo o mundo poderiam ser automatizados de alguma forma com o uso da IA. Segundo a pesquisa, a tendência é que os países desenvolvidos sejam mais afetados que os emergentes, dado o maior número de trabalhadores de “colarinho branco” em mercados mais avançados.
Perguntado sobre o impacto do Chat GPT no mercado de trabalho em entrevista à ABC News, Sam Altman, CEO da Open AI, afirmou que a ferramenta, de fato, eliminará várias ocupações. Todavia, o investidor se mostra otimista em relação ao futuro.
“A criatividade humana não tem limites, nós acharemos novos trabalhos. Nós acharemos novas coisas para fazer”.
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O artigo acima foi editado por Beatriz Oliveira Testa.
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